30 de March de 2015
EMBARGOS INFRINGENTES. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. COMPRA E VENDA COM PACTO RETROVENDA. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. MANUTENÇÃO DA CONCLUSÃO APRESENTADA NO VOTO VENCEDOR. EMBARGOS INFRINGENTES DESPROVIDOS.

EMBARGOS INFRINGENTES

NONO GRUPO CÍVEL

Nº 70055687586 (N° CNJ: 0293385-57.2013.8.21.7000)

COMARCA DE PORTO ALEGRE

CILON JOSE SILVEIRA

EMBARGANTE

ALCEU DE OLIVEIRA LOPES

EMBARGADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes do Nono Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento aos embargos infringentes.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO (PRESIDENTE), DES. PEDRO CELSO DAL PRÁ, DES. NELSON JOSÉ GONZAGA, DES. GELSON ROLIM STOCKER, DES.ª LIÉGE PURICELLI PIRES, DES. JOÃO MORENO POMAR E DES. HELENO TREGNAGO SARAIVA.

Porto Alegre, 21 de março de 2014.

DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA,

Relator.

RELATÓRIO

DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA (RELATOR)

Trata-se de embargos infringentes (fls. 280-284) interpostos por Cilon José Silveira em desfavor de Alceu de Oliveira e Outros.

O embargante insurge-se contra acórdão que julgou a Apelação Cível nº 70043391051, em que a 18ª Câmara Cível, em composição de julgamento formada pela Dra. Elaine Maria Canto da Fonseca, Desembargador Pedro Celso Dal Prá e Desembargadora Nara Leonor Castro Garcia, por maioria, vencida a julgadora relatora, deu parcial provimento ao apelo.

O embargante resgata que a demanda foi julgada procedente em primeiro grau, decretando o despejo dos réus, bem como julgando improcedente a ação consignatória que tinha como finalidade consolidar retrovenda. Relata que a parte recorrida, em grau de apelação, requereu a reforma da decisão em seu todo solicitando a reversão das custas e dos honorários. Alega não se conformar com a decisão. Considera que o voto vencido, da lavra da Dra. Elaine Maria Canto da Fonseca, é o que está mais em consonância com atual doutrina e captou as manobras que os recorrentes efetuaram durante o feito. Garante que em junho de 2012 verificou que existia outra empresa utilizando o imóvel objeto da presente demanda. Assevera ter notificado a empresa vindo a ser informado que quem locava o prédio era Francisco Felini. Pontua que Francisco era terceiro totalmente desconhecido, sem qualquer notícia de direitos dele sobre o imóvel ou que fosse mandatário do recorrente. Refere que ante esse quadro considerou estar diante de posse injusta, restando configurado esbulho possessório. Narra ter ingressado com ação de reintegração de posse, obtendo liminar. Sustenta que antes do cumprimento do mandado a empresa ré ingressou com ação e apresentou documentos de suma importância para o presente feito (os quais integram o presente recurso). Aduz que a documentação demonstra haver fortes indícios de uma fraude e de manobras. Destaca que a verdade é que os recorridos nunca tiveram capacidade para efetivar a retrovenda. Alega que a documentação juntada naquele processo demonstra que os recorrentes “venderam” o imóvel pelo valor de R$ 183.118,51 para terceiro para então depositar o valor da retrovenda. Garante que os recorridos tentaram de todas as formas ganhar tempo para poder efetivar a retrovenda, mesmo já fora do prazo para exercer tal direito. Aduz que depois de meses, de idas e vindas com pedidos de parcelamentos com depósito de cheque sem fundo, veio a ser depositado o valor de R$ 133.118,51. Registra que a guia de depósito foi emitida no mesmo dia em que supostamente Alceu vendeu o imóvel para Francisco Felini. Entende que os novos documentos são suficientes para que se reverta a decisão da apelação. Pondera que a manutenção da decisão fere frontalmente o artigo 505 do Código Civil, bem como o artigo 506 também do Código Civil. Considera que os recorridos agiram com má-fé não só por não cumprirem a retrovenda, mas por não comprimirem o contrato de aluguel, bem como por deixarem de pagar impostos. Requerem sejam julgados procedentes os embargos infringentes modificando a decisão e confirmando a sentença de primeiro grau.

Preparo na fl. 242.

A parte embargada deixou transcorrer in albis o prazo para oferecimento de contrarrazões (fl. 244).

Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTOS

DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA (RELATOR)

Adianto que estou em negar provimento ao recurso, a fim de fazer prevalecer o entendimento majoritário.

Observo que o voto vencedor sopesou excepcionalidades do caso concreto. Restou analisado, por exemplo, o fato do imóvel ter sido vendido por R$ 120.000,00, valor muito inferior ao montante que correspondeu a avaliação para fins de cálculo de imposto de transmissão (o bem foi avaliado por R$ 350.000,00). Ademais, restaram consideradas as justificativas pelo atraso (venda de imóvel a terceiro para obtenção do valor da retrovenda) e a concordância com o pagamento intempestivo.

Reporto-me, nesse sentido, à fundamentação do voto proferido pelo ilustre Desembargador Pedro Celso Dal Prá, ao qual estou aderindo, in verbis (fls. 179-181):

A ação de consignação em pagamento foi ajuizada em 08/10/2009, antes, portanto, de vencido o prazo para o exercício da recompra, previsto na “Escritura Pública de Compra e Venda, com Pacto de Retrovenda” firmado entre as partes, que era de 14/10/2009.

A notificação prévia ajustada na cláusula “II.2” da avença foi realizada por meio de telegrama, conforme cópia de fl. 23.

E o depósito, ainda que, efetivamente, não tenha sido feito no prazo concedido pelo Juízo (fls. 66/67), ao fim e ao cabo acabou por ser realizado pouco mais de quatro meses depois da intimação (fl. 79).

Em que pese as justificativas apresentadas pelos autores, em princípio, não se prestem para justificar o atraso, pois, a rigor, deveriam ter demonstrado a disponibilidade do dinheiro na data do vencimento do prazo da retrovenda, tenho, na excepcionalidade das circunstâncias que envolvem a contratação, por relevante a justificativa apresentada em fls. 68/72, mormente porque a venda de outro imóvel a terceiro, para o pagamento da obrigação ajustada no contrato, foi formalizada em 15/10/2009, quase que concomitantemente ao vencimento do prazo ajustado.

Ademais, mesmo não sendo questões tratadas diretamente na ação consignatória (ou de cumprimento de obrigação), que, por sua natureza, não permitiria tal debate, não se pode deixar de considerar que a origem do negócio jurídico entabulado entre as partes foi, segundo consta, empréstimo de dinheiro a juros. Também relevante o fato de o imóvel ter sido vendido por R$ 120.000,00, quando a avaliação do fisco municipal, para fins de cálculo do ITBI, foi de R$ 350.000,00.

De outro lado, verifico que, em petição de fls. 82/84, os próprios réus concordaram com o pagamento intempestivo realizado, impondo apenas duas condições: complementação do valor depositado (R$ 20.782,15) e vedação à transferência do imóvel a terceiros, enquanto pendente a cobrança de aluguéis.

Mesmo não aceitando as condições, os autores complementaram o depósito inicial com o valor de R$ 7.572,13 (fl. 98).

Neste quadro, sopesado, como dito, o conjunto de circunstâncias que envolvem o negócio realizado entre as partes e o tramitar processual, tenho que a solução de improcedência da ação, que acarretará não só a perda de imóvel avaliado em R$ 350.000,00, pelo empréstimo do valor de R$ 120.000,00, mas também na condenação ao pagamento de alugueres substanciais pelo uso do mesmo imóvel, não se apresenta justa, acarretando potencial enriquecimento sem causa justificável.

A melhor solução para o litígio passa, a meu ver, pelo reconhecimento do pagamento efetuado pelos autores, pondo fim à obrigação ajustada na retrovenda, retornando, via-de-conseqüência, o imóvel ao domínio dos demandantes.

Contudo, tenho por correta a sentença no que tange à necessidade de complementação dos valores depositados, sendo cabível a atualização do valor desde a data da lavratura da escritura, 14/10/2008, até a data do depósito, com juros de mora de 1% ao mês (ainda que não previstos no contrato, há amparo no art. 406 do CC) a contar de 14/10/2009, também até a data do depósito. O retorno do imóvel à titularidade dos autores somente poderá ocorrer após o adimplemento deste saldo, conforme disposição contida no art. 506 do Código Civil, verbis:

Art. 506. Se o comprador se recusar a receber as quantias a que faz jus, o vendedor, para exercer o direito de resgate, as depositará judicialmente.

Parágrafo único. Verificada a insuficiência do depósito judicial, não será o vendedor restituído no domínio da coisa, até e enquanto não for integralmente pago o comprador.

No que diz respeito à ação de despejo apensa, por este mesmo conjunto de fatos e circunstâncias, concluo que deve ser julgado parcialmente procedente o pedido.

São fatos incontroversos que o contrato foi assinado pelos réus e que não houve o pagamento de qualquer parcela de aluguel.

A justificativa para a inadimplência foi ter aquele contrato (de aluguel) a mesma origem, operação de empréstimo de dinheiro com juros, que o contrato de compra e venda com pacto de retrovenda, onde teriam sido cobrados juros acima do permissivo legal.

Não houve, contudo, prova cabal da prática de agiotagem pelos autores do despejo, mas apenas indícios, como reconhecido pela sentença, em que pese possibilitada a produção de tal prova (fls. 104/110, 111/114 e certidão de fl. 116).

Todavia, em razão do resultado preconizado para a ação de consignação, inviável o despejo, porquanto reconhecido o retorno da propriedade do imóvel a Alceu e Climaco.

Cabível, entretanto, a condenação dos réus ao pagamento dos aluguéis vencidos, no período compreendido entre a data prevista no contrato, 10/10/2008 (fls. 23/29 da ação de despejo) até a data do ajuizamento da ação consignatória, 08/10/2009 (fl. 02), com os consectários previstos na sentença (correção monetária pelo IGP-M, juros de mora de 1% ao mês e multa de 10%) já que não especificamente impugnados.

Em conclusão, dou parcial provimento ao recurso de apelação para:

a) julgar parcialmente procedente a “ação de cumprimento de cláusula contratual estipulada em escritura pública de compra e venda com pacto de retrovenda com consignação em pagamento” promovida por Alceu de Oliveira Lopes e Clímaco de Oliveira Lopes contra Cilon José Silveira e Laurete Silveira Virgulino Silveira, a fim de liberar os autores da obrigação ajustada no contrato firmado entre as partes, reconhecendo, todavia, a existência de saldo a ser calculado posteriormente, nos termos da fundamentação, ressalvando que o retorno do imóvel ao domínio dos autores se dará somente com o pagamento deste resíduo. Condeno cada parte ao pagamento de metade das custas processuais e dos honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, fixados em R$ 2.500,00, com compensação (art. 21 do CPC e Súmula n.º 306 do STJ) e exigibilidade suspensa em razão do benefício da Assistência Judiciária Gratuita concedido às partes;

b) julgar parcialmente procedente a ação de despejo promovida por Cilon José Silveira em desfavor de Alceu de Oliveira, Rita de Cássia Dahmer Vargas e LF Indústria e Comércio de Pescados Ltda, para condenar os réus ao pagamento dos alugueres de 10/10/2008 a 08/10/2009, pelo valor dos locativos ajustados no contrato, com correção monetária pelo IGP-M e juros de mora de 1% ao mês, da data do inadimplemento até o efetivo pagamento, além de multa de 10%.

Sucumbência também por metade, com honorários fixados em R$ 2.500,00 a cada parte, com compensação (art. 21 do CPC e Súmula n.º 306 do STJ) e exigibilidade suspensa em razão do benefício da Assistência Judiciária Gratuita concedido às partes.

Ante o exposto, nego provimento aos embargos infringentes.

DES.ª LIÉGE PURICELLI PIRES (REVISORA)

Estou acompanhando o voto do eminente Relator que reconhece como justa a solução encontrada pelo revisor da Apelação, Des. Pedro Celso Dal Prá, decisão que, por maioria, deu provimento parcial aquele recurso.

DES. PEDRO CELSO DAL PRÁ

Acompanho o eminente Relator e desacolho os embargos infringentes, mantendo o voto que proferi por ocasião do julgamento originário.

DES. JOÃO MORENO POMAR - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. HELENO TREGNAGO SARAIVA

Acompanho o eminente Relator.

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. NELSON JOSÉ GONZAGA

Acompanho o insigne Relator.

DES. GELSON ROLIM STOCKER

Acompanho o voto do E. Relator, diante das peculiaridades do caso concreto.

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO - Presidente - Embargos Infringentes nº 70055687586, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: SANDRO SILVA SANCHOTENE

Disponível no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

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